felipe lima
Jornalista, é fundador da agência Leopoldo Electrical Group
Eu me perco dentro dos meus próprios deadlines. Washington Olivetto morreu na semana passada e eu cozinhando o texto até agora, quando sou surpreendido pela morte de Antonio Cicero – outro que também merecerá menção em texto. Achei melhor não enrolar mais.
Nunca o conheci pessoalmente. Infelizmente, não me incluo na longa lista dos que tiveram o privilégio de tomar um uísque com ele na baixa Paris ou saborear ao seu lado a melhor moqueca de Salvador, em alguma portinha desconhecida e exclusiva no centro velho da cidade – ou num beco de Nova York. Sim, moqueca em Nova York. Com ele era assim. E eu adoraria ter feito parte de tudo isso, ou de parte disso junto com ele.
Washington Olivetto sempre me pareceu uma figura interessantíssima, principalmente por ter sido aquele cara que sempre estava lá. Sabe aquela coisa meio Nelson Motta, que participou de tudo e não há história da nossa cultura recente em que ele não esteja envolvido? Washington era assim – inclusive, com muitas histórias com o próprio Nelson Motta. No entanto, o curioso é que toda a sua inegável genialidade (e aqui eu tenho que ter algum cuidado com termo, já que, infelizmente, está mais malhado que Judas em Sábado de Aleluia) nunca foi muito clara para mim. Ok, ele tinha boas, ótimas ideias, mas fazia o que, exatamente? Era o cara que escrevia, que botava a mão na massa, ou era quem só tinha a ideia (o que, convenhamos, é grande parte do jogo, quem mexe com isso sabe)? Ou, ainda, ele era só o meio de campo, que ligava os pontos e as peças e fazia a coisa funcionar? O que, exatamente, o levou a ser o grande Washington Olivetto?
Comentando sobre essa questão com meu bom amigo Cesar, nos tempos em que fazíamos juntos o WCast – e aqui eu peço um momento para registrar que decretamos esse nome muito antes de Olivetto criar seu podcast homônimo, sem nunca nos ter pedido licença para tanto. É bem verdade que havia, de certa maneira, também uma homenagem ali, mas, acima de tudo, era uma associação direta com WC, de “water closet”, como se usava chamar o banheiro em tempos idos. Retomando, ao falar disso com ele, descobri que compartilhávamos desse mesmo interesse e fascínio pelo publicitário, ou pela aura (para mim, enigmática) que o envolvia. Passado um tempo, Cesar me presenteia com sua autobiografia “Direto de Washington”, uma delícia de livro, a partir de onde pude, finalmente, traçar a vida de Olivetto e entender não só seu brilhantismo, como também sua absoluta – e absolutamente justificável – falta de modéstia. Ele era bom e sabia disso.
Para mim, jornalista, homem de comunicação, profissional da língua portuguesa e, sobretudo, boêmio, ir repassando toda essa trajetória de sucesso, toda uma vida bem vivida, bem remunerada, bebendo nos melhores bares, comendo nos melhores restaurantes mundo afora, trabalhando, frequentando, principalmente, sendo frequentado pelos maiores nomes dos mais variados nichos, me dá algumas sensações. A primeira delas, evidentemente, é a de absoluto fracasso. Ele, no alto de seus vinte e poucos anos, já estava empilhando seus Cannes; eu, aqui, quase aos quarenta passando longe de tudo isso. Vejam, eu estou longe de me considerar um fracasso, que fique claro. Mas, porra, quando a régua é o Washington Olivetto e sua inexistente modéstia, não há autoestima que resista, convenhamos.
E, honestamente, nem quero entrar nessa matéria de o que fiz da minha vida até agora. Sei melhor que ninguém que cada qual ao seu tempo, cada história ao seu momento. Ok, vamos adiante. Mas, que dá um siricutico qualquer, isso dá.
E não para por aí. Lendo todos os relatos que pululam nas redes e jornais, majoritariamente elogiosos, fica também a sensação de terem estado diante de alguém profusamente culto, com sempre algo inteligente a dizer, sempre muito bem-informado e com uma contribuição indispensável pronta para ser dada. Bem, eu não duvido de nada disso, mesmo, mas, puxa vida… E eu, fico como nisso tudo? Será que chego lá? Ou, se preferirem, será que preciso chegar lá?
O problema, afinal, de se interessar por essas figuras acima da média e, ao mesmo tempo, ter o ego algo inflado é que fica não só a vontade de ter estado lá, junto com eles, fazendo tudo aquilo, vivendo toda aquela vida, mas também de ser um pouco eles, de construir algo realmente relevante e, principalmente, que tenham algo bom (bom mesmo, não que você era um cara legal e vai deixar saudades) para dizer sobre você na hora em que pedir a conta.
Que Washington, de onde estiver, ilumine, ao menos um pouquinho, os nossos passos por aqui, meu e do meu ego.
Excelentes palavras, meu caro! E, bacana esse seu amigo que te presenteou com a biografia do W, hein?!